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Quatro gerações de uma família unidas no gás, combustíveis e novos negócios

12-01-2019

A empresa A.C.Cymbron SA assinala hoje os 70 anos de vida com uma festa com colaboradores e revendedores numa unidade hoteleira na Ribeira Grande. Ao longo de quatro gerações, a empresa, que iniciou a sua actividade na construção civil e venda de cimento, desenvolve a sua actividade nos segmentos da venda de gás e combustíveis e estende a sua área de negócios para o comércio de motorizadas e rent-a-car.
Actualmente, faz parte do grupo empresarial ‘Vicymbron SGPS’, em que a família Borges de Sousa detém 80% do capital social. São sócios do grupo empresarial, Vicente Borges de Sousa, que é o Presidente do Conselho de Administração; a esposa Luísa Borges de Sousa; a filha Sónia Borges de Sousa; e os netos Carolina Borges de Sousa Brito e Diogo Borges e Sousa. Duas filhas do Drº José Cymbron, a Drª Helena Botelho Sousa Cymbron e Ana Maria Botelho de Sousa Cymbron são as outras acionistas.
Vicente Borges de Sousa, com 85 anos de idade, recorda o tempo em que o pai, o irmão José Cymbron; a irmã Mariana Cymbron e Alfredo Pimentel fundaram a empresa A.C.Cymbron há, precisamente, setenta anos, com uma empresa de construção civil. Maria de Chaves Cymbron, que foi sócia fundadora do grupo, colaboradora e gerente da empresa, terá sido, há 70 anos, a primeira gerente de uma empresa na Região.

A entrada de Vicente Borges de Sousa

Quando Vicente Borges de Sousa completou o serviço militar, com 23 anos, começou a trabalhar na empresa que, na altura, tinha como principal negócio a venda de cimento que importava de Lisboa. A empresa A.C.Cymbron tinha, na altura, uma quota de 60% na venda de cimento em São Miguel. “Nunca quisemos aumentar a quota porque o outro sócio, proprietário das outras fábricas, podia fazer-nos concorrência e, então, no lugar de termos 60%, passávamos a ter 10%”, explicou o empresário.
Anos mais tarde, devido aos conhecimentos do pai Vicente Chaves Cymbron e dos tios Pedro Chaves Cymbron e José de Chaves Cymbron , a empresa A.C.Cymbron foi nomeada agente da SACOR e da CIDLA, começando por vender gás. A primeira importação e gás ocorre, por volta de 1960, e uma das primeiras 20 garrafas que chegaram a São Miguel foi para o Dr. Trigo e Silva que era o gerente do Banco Espírito Santo e que já usava gás no continente.
A empresa cresceu, de forma sólida e, alguns anos depois, já importava 26 mil garrafas de gás por mês. “Já era muita coisa”, admitiu Vicente Borges de Sousa.
A partir de certa altura, descreve Vicente Borges de Sousa, o tio Pedro, que fazia parte da firma, começou a estudar a hipótese de se fazer em São Miguel uma estação de enchimento de gás. “Conseguimos convencer a CIDLA, fizemos a estação de enchimento em que a CIDLA tinha 50 a 60%, A Shell ficou com 30 a 40% e a família Cymbron ficou com 10%. As acções deveriam ser distribuídas por meu pai, meu tio José e por meu tio Pedro, mas o senhor Casal Ribeiro, que era o presidente da CIDLA, quis que eu ficasse sócio da empresa porque eu tinha contribuído muito para a instalação da CIDLA em São Miguel e tive umas acções oferecidas”, recorda.
A CIDLA passou, entretanto, a designar-se Petrogal e, em determinada altura, quis comprar as acções dos sócios locais e muitos deles venderam, incluindo Vicente Borges de Sousa que, numa fase posterior, recuperou 200 a 300 acções.

As primeiras ‘bombas’ A.C.Cymbron

Três anos depois de iniciar a distribuição de gás, a empresa A.C.Cymbron começou a vender combustíveis. Primeiro, na antiga Garagem Viveiros, na antiga Rua do Gaspar, num edifício que até há bem pouco tempo foi da Caixa de Previdência. As bombas foram montadas no rés-do-chão do edifício. Instalaram também ‘bombas de gasolina’ na Travessa do Passal; defronte do estabelecimento prisional; na conhecida Garagem de São José, na Rua de Lisboa; na Ribeira Grande; e em Vila Franca do Campo.
“O negócio foi-se desenvolvendo com o contributo de muitos sócios e familiares, o Dr. Antonio Cymbron, o Dr.º Augusto Botelho de Sousa Cymbron e o seu filho Carlos Lima Cymbron que durante anos foram os timoneiros deste barco. Eu fui sempre trabalhando, trabalhando, até que há três a quatro anos passei o testemunho à Sónia que já estava a trabalhar na firma porque o meu estado de saúde já não estava bom. Portanto, eu sou a segunda geração da empresa e a quarta geração da família (Carolina, filha de Sónia Borges de Sousa) já começou a assumir funções na firma”, sublinha Vicente Borges de Sousa com orgulho.
Quando questionado sobre que memória guarda dos 70 anos da empresa, o empresário realça o facto de o A.C.Cymbron “ter conseguido vingar no mercado e termos trabalhado sempre com honestidade”.
“Temos uma rede de revendedores que ficaram sempre nossos amigos. Temos ainda hoje revendedores da parte dos combustíveis e do gás que vêm desde o início. Não se pode dizer que isso seja muito frequente. Nós temos bons testemunhos de revendedores. Em alguns casos já não serão os pais, mas são os filhos que mantêm o negócio na família”, afirmou Vicente Borges de Sousa.

Correio dos Açores – Qual foi o momento mas importante da empresa durante o seu tempo?
Vicente Borges de Sousa – O mais importante terá sido a inauguração da SAAGA, estação de enchimento de gás que, de facto, foi um marco difícil de conseguir. Estávamos próximos do aeroporto que se previa ali. Tivemos dificuldades com o exército que também foi preciso resolver. Para se conseguirem as licenças deu muito trabalho. Foi preciso fazer sondagens do terreno para saber se podíamos lá colocar as esferas. E, portanto, a inauguração foi um marco de um investimento muito grande que ainda não se tinha feito na ilha.
Havia o investimento do tempo da guerra, dos tanques de fuel do Bensaude. Mas, depois, nunca mais tinha havido um investimento de tão grande envergadura. Para mim foi um investimento que me marcou.
A construção da Estação de Serviço de Abastecimento de Combustíveis das Laranjeiras foi outro marco importante. Meu irmão, José Borges de Sousa, nesta altura, trabalhava comigo e andamos a estudar o local para fazer um posto de abastecimento como devia ser. A nossa primeira localização era no espaço onde hoje está a Dionísio Carreiro de Almeida. A Secretaria das Obras Públicas não autorizou e encontrámos aquele terreno que era de uma pessoa familiar. Compramos o terreno, mas parte do espaço estava alugado ao exército. Havia ali um quartel que ocupava todos aqueles terrenos. Só alguns anos depois é que o exército cedeu-nos os terrenos. Portanto, quando fizemos aquele posto, fomos condicionados pelo terreno que tínhamos disponível na altura.
Este foi também um marco importante porque foi o primeiro posto de abastecimento de combustíveis do género do continente que se fez. Anos mais tarde, cheguei à conclusão que a loja estava pequena e fez-se a ampliação da loja. Hoje, a minha neta já fala em fazer uma nova ampliação da loja mas esta pretensão está condicionada pelos serviços que lá temos.

A marca A.C.Cymbron
a impôr-se às petrolíferas…

Sónia Borges de Sousa – Há também um outro marco importante no crescimento da empresa A.C.Cymbron, que foi quando, no início da década de 80, as companhias petrolíferas acabam com as agências e resolvem vir directamente para o mercado dos Açores. E, nesta altura, a construção de postos, propriedade A.C.Cymbron, foi a solução que nós encontrámos para continuarmos a ter algum poder de acção.
O A.C.Cymbron é, neste momento, detentor de quatro postos de abastecimento de combustíveis. Explora directamente dois e em dois tem contratos de exploração cedidos a terceiros. Mas, por contrapartida, tem um posto em que faz a exploração sendo propriedade da GALP. Este é um marco importante.
Um outro grande marco que eu entendo que a empresa conseguiu foi que, normalmente, costuma-se dizer que a primeira geração constrói, a segunda geração mantém e a terceira destrói. E aquilo que também valoriza esta empresa, é que a terceira geração da família manteve os negócios e já vamos na quarta geração dentro da empresa.
E, neste momento, a empresa procura novas oportunidades de negócio, face à circunstância de haver uma quebra no consumo de gás, como nas margens da política regional dos combustíveis.

Como ocorre a quebra no consumo de gás?
Sónia Borges de Sousa – O consumo de gás, neste momento, está ao nível de 2010. Isto por várias razões, uma das quais a redução da população. Além disso, a crise económica levou a que as pessoas fizessem poupanças (utiliza-se menos o forno do fogão, os banhos são mais reduzidos e são traduzidos em duche). Havia até uma senhora que dizia: “olha, faço agora aquilo que se fazia no meu tempo, os miúdos vão todos ao mesmo tempo para dentro da banheira”. E a verdade é que com a crise e com as pessoas a terem que poupar, logicamente, vão procurando maneiras de cortar nas despesas.
Por outro lado, temos uma concorrência que até costumo dizer, entre aspas, um pouco desleal, que são as energias alternativas. Neste caso é a electricidade. A electricidade todos os anos aumenta o seu preço. A EDA tem lucros e a EDA promove a aquisição de electrodomésticos que utilizam a luz e não o gás. E fazem-no adoptando uma apologia que é a de a electricidade ser uma energia mais limpa que o gás. A electricidade seria mais limpa se fosse apenas com base nas energias renováveis. Mas, neste momento, a EDA produz electricidade recorrendo, em 53%, ao fuel que é bastante mais poluente que o gás.
Até porque o gás não é uma energia tão poluente quanto as pessoas, por vezes, querem fazer crer.

A outra questão é a política dos combustíveis…
É uma política detractora do crescimento dos postos de abastecimento. E há muitas empresas, principalmente do ramo do gás, que estão a sair do mercado. Quando temos um negócio que não se remunera a si próprio, acabamos com o negócio. Por conseguinte, há muito pequeno revendedor que tem encerrado. As pessoas, se não tiverem o gás disponível à porta, também vão procurar outras alternativas e outras soluções.
Há um conjunto de factores que ponderam e que fazem com que exista, neste momento, uma quebra no mercado.

Estão a procurar alternativas de negócio?
Carolina Borges de Sousa Brito (neta de Vicente Borges de Sousa) – Estamos à procura de novas alternativas de negócio e a retomar negócios antigos. A empresa A.C.Cymbron tem uma parte ligada às ferramentas que continua a ser importante. Teve a sua quebra no período da crise, mas que está outra vez a recuperar e continua a ser uma boa área de negócio. E, mais ou menos por altura da crise, abrimos a área de negócio de venda de motos que também é importante. Os representantes de boas marcas, quer ao nível dos motociclos, quer ao nível dos acessórios, é uma área de negócio que nos está a correr bem. E uma última área foi a rent-a-car mais virada para o turismo que está a crescer de forma sustentável, devagar e esperamos que tenha também pernas para andar. São três áreas que, não sendo totalmente novas, também são importantes para a empresa A.C.Cymbron.

Enquanto se passar para este novo ciclo, mantém-se o gás e mantém-se os combustíveis…
Carolina Brito – Mantém-se o gás e mantém-se o combustível mas há que pensar que vão ser necessárias novas alternativas. Neste momento, as grandes petrolíferas também estão a pensar no que vão fazer face à concorrência. E vai haver um ajustamento quer das grandes petrolíferas, quer da nossa parte, quer dos revendedores. Não podemos ter as portas fechadas em nenhuma área, neste momento.
Sónia Borges de Sousa – Os combustíveis fósseis estão no fim da linha. Quer a gasolina como o gasóleo (e no gasóleo já há uma série de marcas de automóveis que abandonaram a produção destes motores). A gasolina ainda não tanto, mas aproxima-se o fim dos combustíveis fósseis. Existem algumas alternativas.
Neste momento, o governo dos Açores tem-se mostrado empenhado nas viaturas eléctricas ou, pelo menos, híbridas. No continente, algumas companhias têm grandes projectos, nomeadamente, na área do hidrogénio que, quando a mim, será a energia do futuro.
Pelas suas exigências técnicas, não creio que tenhamos capacidade de, sozinhos, arrancar com projectos nestes domínios. Por exemplo, no caso de abastecimento de veículos movidos a electricidade, os quadros técnicos exigidos à empresa, nomeadamente em termos de engenheiros electromecânicos, face ao consumo, eram incomportáveis, daí que tenhamos -nos juntado à GALP, para podermos fazer a candidatura.
E, no hidrogénio, mais complicado será porque maiores serão as exigências. Trabalhar com hidrogénio apresenta muito mais perigo. E, por conseguinte, a independência dos pequenos e médios operadores irá diluir-se face àquilo que é perspectivado. E, portanto, temos de dar a volta e procurarmos outros ramos de negócio e fazer a requalificação da empresa.
E acho interessante que, nesta fase, comecem a entrar as novas gerações da família no grupo empresarial numa altura em que a área de negócios mais importante continua a ser os combustíveis, mas já pensamos em novas alternativas.

Carolina Brito – Atenção que nós não estamos contra o eléctrico. Aliás, nós assinamos a Cartilha da Sustentabilidade com o Governo dos Açores e um dos nossos objectivos é começar com a frota eléctrica de rent-a-car e, portanto, não estamos contra os postos que vão ter as redes de recarregamento eléctrico. Nós também vamos trabalhar ao lado do eléctrico. E, entretanto, não vai acabar já o combustível…

Sónia Borges de Sousa – Quando fizemos, há 10 anos, a remodelação da loja, nós preparamos o posto das Laranjeiras para o carregamento eléctrico. Até hoje ainda não foi licenciada a venda de electricidade para reabastecer viaturas. E, neste momento, tudo aquilo que na altura fizemos, praticamente será pouco aproveitado porque a evolução da tecnologia foi de tal ordem que teremos de substituir cabos, alterar o quadro eléctrico…
Neste momento, em termos de energias, todos os anos saem novas soluções e todos os anos há upgrades nas soluções encontradas.

Quando se começar a negociar o carregamento dos postos de carregamento de carros eléctricos o ‘A.C.Cymbron’ vai estar lá…
Sónia Borges de Sousa – Vamos estar lá. Aliás, já podíamos estar se tivesse sido possível. Há 10 anos que tínhamos tudo preparado para isso.

“É um orgulho dizer que esta empresa
nunca teve um ordenado em atraso”

A Carolina Brito é a mais jovem a envolver-se nos negócios. Quais as suas áreas de actuação?

Carolina Brito. Faço de tudo. Estou na fase da aprendizagem. Quero aprender tudo e vou fazendo de tudo. Faço a parte da comunicação e imagem. Faço também a parte comercial, principalmente, no negócio das motos e ferramentas.

Sónia Borges de Sousa – A Carolina está, neste momento, a ser treinada para se envolver na área financeira. E vai aprendendo um pouco dentro da área dos recursos humanos.
O A.C.Cymbron tem 107 colaboradores. Já é uma empresa com uma certa dimensão para o tecido empresarial regional.
O quadro da empresa é minimamente estável. É um orgulho dizer que esta empresa, ao longo dos seus 70 anos, nunca teve um ordenado em atraso. Nós pagámos atempadamente e cumprimos com as nossas obrigações. Temos muitos colaboradores com mais de 25 anos de casa e cerca de 15% é capaz de ter cerca de 40 anos de casa. E, portanto, chegando ao fim da sua vida profissional, muitos colaboradores enquanto aguardam pela reforma colocam baixa. Por média, temos cerca de sete a oito colaboradores de baixa.
A rent-a-car exigiu que houvesse um aumento dos recursos humanos. Admitimos cinco profissionais.
Por outro lado, e isto tem sido uma aposta bastante positiva do A.C.Cymbron, é a entrada de pessoas novas com características diferentes e com formação diferente, o que permite alargar áreas de negócios. Por exemplo, com a entrada de dois programadores nos quadros da empresa desenvolvemos os nossos próprios programas informáticos de gestão das diferentes áreas de negócio e uma das apostas que, neste momento, temos, – mas que são processos longos – até porque muitas vezes implicam a ida ao Continente para conseguir licenciá-los, é comercializar os programas que nós desenvolvemos.
E temos um programa que foi desenvolvido pelo A.C. Cymbron em termos de gestão da frota, um programa de gestão de clientes de gás canalizado, um programa de gestão de postos de abastecimentos que inclui o HCCP, com todas as obrigações legais referentes à venda de combustível. Temos  ainda um programa de gestão de encaminhamento de solicitação de pedidos de gás. E estes são os quatro programas com maior dimensão. Três deles estão preparados e podem ser comercializados.
Por exemplo, o programa do gás canalizado que origina a factura, nós tivemos que mandar o programador com não sei quantos dossiês atrás, às Finanças no continente porque aqui não o fazem!

 

in Correio dos Açores, 12 Jan 2019, João Paz